"Existe algo que seja tão evidente que não possa ser questionado ? Não seria possível que nossas vidas não passem de sonho, ou que o mundo seja apenas uma invenção de nossa imaginação ? (...) Entretanto, há outras idéias que parecem ser verdade. Não importa se você está dormindo ou acordado: dois e dois são sempre quatro. (...) Mas e se Deus, ou um demônio muito poderoso e maligno, estiver enganando você ? "
Já ouviu isto em algum lugar ? Se identificou com alguma parte ? Provavelmente sim, pois o trecho acima abre o livro O Porco Filósofo (The Pig that Wants to be Eaten and 99 other thought experiments) do filósofo inglês Julian Baggini e na verdade vêm de uma publicação datada de 1641 escrita por René Descartes. A ideia de que podemos estar sendo controlados já foi largamente explorada, sendo uma das melhores referências atuais o filme Matrix e este é um dos trunfos de Baggini em O Porco (só para os intimos), conseguir explicar conceitos a primeira vista complexos, mas que quando colocados em um contexto mais palpável ou com as devidas referências te deixam com aquela expressão, - Há então era isto!
No decorrer do livro aparecem as mais diversas referências pop's como Laranja Mecânica, Picasso, Guia do Mochileiro, um suposto pedido de paz enviado por Hitler, o filme O Dia da Marmota, neste ele vai longe e consegue fazer um paralelo com Assim Falou Zaratustra, que confesso realmente me ajudou a entender o que o Nietzsche queria dizer com todo aquele papo de Super-Homem.
Como diz o titulo em inglês são 100 pequenas reflexões sobre o cotidiano partindo de conceitos fundamentais da vida, universo e tudo mais, aliás o título original seria algo como, O Porco Que Queria Ser Comido (...), uma das duas referências ao livro O Guia do Mochileiro das Galáxias quando Arthur se depara com um porco falante e que gostaria e muito de ser comido !? chegando a sugerir as melhores partes de sua anatomia para isto, aqui Baggini propõe uma discussão sobre o comportamento dos vegetarianos, se existisse um animal criado e modificado para desejar ser comido e durante toda sua vida não tivesse tido conhecimento do que é sofrimento, quase como um vegetal, ainda existira oposição ao consumo de carne ? É importante dizer que Baggini não toma partido em nenhuma reflexão, aí você pode pensar - Ah fraco, de que me adianta então ? Exatamente por isto, são reflexões a respeito de problemas milenares e tão incutidos em nossas
vidas que geralmente passamos despercebidos talvez um porco falante ou saber se você está ou não dentro da Matrix pareça uma preocupação boba, vamos para algo mais prático então, quando ocorre um erro bancário a seu favor o que você faz ? e quanto aos crimes de guerra ? É válido torturar alguém para obter informações que podem salvar milhares ? Matar menos é uma opção para salvar muitos ? em teoria é fácil, você levanta e diz, "-Claro que não ! uma morte é sempre uma morte." mas e na prática isso ocorre realmente ? Essa proposta de dar chance para a reflexão, que me fez comprar e adorar este livro, e como o autor bem diz nesses casos "A moralidade da guerra é uma questão espinhosa que não pode ser resolvida por uma simples contagem de vidas perdidas e salvas."
Com disse o livro é cheio dessas pequenas histórias o que torna a leitura extremamente fácil, em duas ou três páginas um pensamento filosófico recorrente é apresentado, a temática é explicada e desenvolvida deixando você livre o dia todo para pensar sobre o assunto, e voltar no dia seguinte querendo mais. Não vou conseguir transmitir aqui todas as referências e conceitos por isto vou terminar com mais uma das reflexões que gostei bastante, mas recomendo fortemente que procure em bibliotecas, livrarias, sebos físicos ou virtuais ah quase esqueço, tem até uma sobre a natureza dos Zumbis :) !
"E Deus falou para o filósofo:
- Eu sou o Senhor teu deus, e sou o Todo-Poderoso. Não há coisa alguma que você possa dizer que não possa ser feita. É fácil!
E o filosofo falou para o Senhor:
- OK, oh todo poderoso. Transforme tudo que é azul em vermelho e tudo o que é vermelho em azul.
O Senhor disse:
- Que se faça a inversão de cores ! E a inversão foi feita, deixando completamente confusos os porta-bandeiras da Polônia e de São Marino.
Então o filósofo disse: - Se quer me impressionar faça um círculo quadrado.
E o senhor falou: - Faça-se um círculo quadrado. - E foi feito.
Mas o filósofo protestou: - Isso não é um círculo quadrado, isso é um quadrado.
O senhor se irritou: - Se eu digo que é um círculo, é um círculo. Cuidado com essa sua impertinência.
Mas o filósofo insistiu: - Eu não pedi para alterar o significado da palavra círculo, pedi um círculo quadrado, um verdadeiro círculo quadrado. Admita isto é algo que o senhor não pode fazer.
O senhor pensou um pouco, então resolveu responder lançando sua vingança poderosa sobre a cabeça do filósofo metido a esperto."